segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Relato Póstumo

Não costumo descrever e explicar muito aquilo que escrevo. Penso que a magia por muitas vezes acaba sendo perdida, como se o brilho fosse embora e a monotonia tomasse conta do escrito.

A mágica é observar o que cada um sente ao ler um mesmo texto. As múltiplas interpretações, a maneira como a escrita pode tocar o âmago de cada um é que faz viva a chama de escrever e expor sentimentos. Este movimento nunca deve cessar, por nada.

Neste caso particular, abro uma exceção, por um motivo próximo que aconteceu este final de semana.

As perdas nos assolam o tempo todo, a todo tempo. A partir do momento que nos pomos a viver, estamos sujeitos a perder um pouco do que essa vida tão perene e breve nos oferece. E tudo isso poderia ser visto apenas pelo lado negativo, porque de fato aquilo que mais se evidencia (a dor) é o que dita a tônica do nosso próprio parecer.

Mas, o quanto ganhamos, não é verdade? O quanto essas pessoas que se foram, apesar da ausência física, podem nos deixar na constituição do que somos. Naquilo que nos ensinaram a sentir, a nos estabelecer. Tantas lições, até mesmo aquilo que não devemos fazer. A vida é assim, um pouco torta também. Somos imperfeitos.

Por mais que a saudade nos deixe frágeis, muito mais forte é a nossa integridade. Nunca paramos para ver o que somos e o quanto as pessoas que nos são importantes foram primordiais para sermos deste modo. Imperfeitos, com limitações, mas ainda assim, SOMOS. Isso nunca se apaga, isso nunca se perde. Por isso, nada morre de fato. É a lei mais bonita que esse Universo (acreditem naquilo que queiram acreditar, o tema é livre) pode proporcionar.

Este texto escrevi em 2007. Para meus dois avós que já se foram e tiveram muito a me mostrar, em todos os âmbitos. Agradeço aos dois eternamente por tudo e desculpo-me pela incompetência de talvez não ter demonstrado isso de uma maneira mais clara. Mas, certamente hoje eles sabem disso...

Homenageio Maria e Francisco com um pouco daquilo que fiz aos meus próprios avós. Somos todos pequenos nessa caminhada, mas devemos ser grandes naquilo que carregamos dentro de si, para a eternidade.

Com muito carinho a eles e à sua neta...


Relato póstumo

Queimaram-me duas lâmpadas,
Nos jardins de cidreira, lá no fundo.
Daquelas que não se encontra fácil,
Em butiques ou “trade centers”.
Uma delas brilhava copiosamente,
Tinha certo ar frenético.
Todavia, nunca faltava em serviço.
Era o desenfreio que a movia.
A segunda era um processo ausente.
Ficava ao fundo, meio febril,
Vez em sempre, travestia-se em fogareiro.
Defumava-me a sala, enquanto ríamos.
Era certo que funcionaria ao Natal,
Brilhando em transcendência.
Por completo, não há reposição.
Há que ser assim, na calada,
Sufocando vicissitudes, uma a uma.
Porque sei, como a primeira e franca lei,
Se ao entardecer, nada mais luzir,
É dado o sinal para partir.

Algum dia da semana do dia 20 de Agosto de 2007




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