Como toda boa série de TV, tudo tem seu devido lugar. Conforme nosso ano solar vai chegando ao fim, os seriados seguem religiosamente a regra, expondo toda sua graça com episódios de Natal, confraternização e é claro, o Ano Novo.
Se a vida é um arremedo da série ou vice-versa, vai da consciência de como cada indivíduo interpreta seu próprio script. De qualquer forma, uma copia a outra e a outra copia a uma. E como todo belo e farto fim de temporada, não poderia faltar o “Amigo Secreto”.
“Amigo Secreto”, como se auto-define o vocábulo, é a arte de ser surpreendido por um amigo não identificado, à priori, que se revela então com um presente, um afago, boas palavras. Não serei hipócrita, então digo que se a idéia fosse realmente baseada no cunho vernáculo da expressão, nossa, que maravilha!
Todavia, a prática nos aparece obscurecida por toda a propriedade que o ser humano tem de ser mesquinho e autocorrupto.
Comecemos pelos limites impostos. Amigo que é amigo presenteia com aquilo que lhe parece adequado e melhor representa o que sente pela pessoa, pela amizade. Se isso se aplicasse, indiferente seria estipular valores. Às vezes algo pequeno e singelo revela as mais práticas e puras intenções. Mas, não. Bota-se já uma cancela no seu limite de felicidade. De tantos R$ até no máximo de R$. Pronto. Este é o valor da sua amizade. Tabelado, como distribuir cotas de seus bens a parentes indesejados.
Como a festa deve continuar, vejamos agora o sorteio. Juro que é engraçado ver as expressões das pessoas ao tirarem seus minúsculos papéis - dobrados com todo o cuidado para que não se revelem os nomes – da “urna da sorte”. Por tantas vezes fica tão clara a reação, que o mais ortodoxo seria largar mão logo neste instante. Peraí! Não é amigo secreto, meu amigo? Por que essa indigestão toda ao ler o nome de João, Francisco ou Maria?
Mais incabível ainda é a inserção daqueles integrantes indesejados ao certame. É, aquela pessoa que ninguém vai com a cara, mas você a comunica por educação. Ninguém quer que ela participe, ninguém quer tirá-la, porém todos sabem que se o convite for feito, ela está dentro. Daí, surgem o rebuliço e as propinas. “Ô Jonas, se eu “tirar” a Gertrudes você troca de amigo comigo? Sabe comé, não me dou muito com a moça não...”. “Zézinho, pelo amor de Deus! Eu tirei o Joca! Não tem como fazermos uma troca amigável de papéis?! Ah, vai! Sei que tu conversa com ele quando param pra tomar um cafezinho!”.
Cá estamos. O amigo-secreto agora é um estiloso jogo de artimanha, mais parecido com uma batalha naval, ou uma partida de War. Deve-se neutralizar o inimigo! Reúna suas tropas, mobilize seus compatriotas!
Para isso, alguém muito sincero e sábio já havia determinado outro termo: Inimigo Secreto.